terça-feira, 6 de julho de 2010

Fernando Pessoa

Quando ainda era criança e minha casa tinha uma estante imensa que ia do chão ao teto cheia de livros, conheci Pessoa. Ele foi apresentado pelo meu pai da melhor forma possível, pelos seus versos. Enquanto estava fazendo qualquer coisa pela casa, meu pai chegava, entusiasmado, com um verso dele. Dizia assim: minha filha, ouça essa do Pessoa! E lia um verso, um poema, ria sozinho, dizia que ele era demais e saia com o livro na mão me deixando a ver navios...portugueses. Não me aguentava de curiosidade, queria ter o livro em minhas mãos, folhear suas páginas, encontrar os versos conhecidos e talvez descobrir novos, tão belos como aqueles lidos por ele. E assim fazia. No começo, me satisfazia encontrando os poemas descobertos pela voz do meu pai. Era difícil, naquela idade, por conta própria, ler os poemas e selecionar aquele verso que nos descontroi, que mexe com as nossas estruturas. Por isso lia muito Fernando Pessoa, lia todos os dias, li por completo Alberto Caeiro, as odes de Ricardo Reis e Álvaro de Campos, inúmeras vezes. Li até aquilo fazer parte de mim. Até conseguir eu mesma, sem a ajuda do meu pai, encontrar em toda sua genialidade, os versos que me tocavam mais do que outros. Depois do Quintana, Pessoa me encantou pra sempre.

Sou guardador de rebanhos
O rebanho é os meus pensamentos
E os meus pensamentos são todos sensações.
Penso  com os olhos e com os ouvidos
E com as mãos e os pés
E com o nariz e a boca.

Pensar uma flor é vê-la e cheira-la
E Comer um fruto é saber-lhe o sentido.

Por isso quando num dia de calor
Me sinto triste de goza-lo tanto.
E me deito ao comprido na erva,
E fecho os olhos quentes,
Sinto todo o meu corpo deitado no realidade
Sei a verdade e sou feliz.

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