quinta-feira, 20 de outubro de 2011

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Felicidade é

Encontrar a peça que faltava para encaixar no quebra-cabeças de mil quatrocentas e noventa e nove peças que não serviam para aquele lugar. 

domingo, 16 de outubro de 2011

Las cuatro estaciones, Elisa Sassi

Outono

Inverno

Primavera

Verão

Stella Im Hultberg




abri as janelas da casa

abri as janelas da casa
cortinas afastadas
dos seus afazeres solares
dispostas numa dança
com o vento


lavei os lençois 
que há pouco dormiam 
amassados de sono
com suas dobras marcando 
a passagem do tempo


pendurei 
pensamentos
lado a lado 
sem presilhas
só dobrados
equilibrados
por um fio


joguei os restos
de tudo fora


guardei o inútil
na gaveta 
e a gaveta
pela janela


já sem nada por fazer
estendi minha alma no varal
as pernas frias para cima
enquanto os móveis da casa
mudavam de cor

sábado, 15 de outubro de 2011

Possibilidades, Wislawa Szymborska

Prefiro o cinema.
Prefiro os gatos.
Prefiro os carvalhos sobre o Warta.
Prefiro Dickens a Dostoiévski.
Prefiro-me gostando das pessoas
do que amando a humanidade.
Prefiro ter agulhas e linha à mão.
Prefiro a cor verde.
Prefiro não achar
que a razão é culpada de tudo.
Prefiro as exceções.
Prefiro sair mais cedo.
Prefiro conversar sobre outra coisa com os médicos.
Prefiro as velhas ilustrações listradas.
Prefiro o ridículo de escrever poemas
ao ridículo de não escrevê-los.
Prefiro, no amor, os aniversários não marcados,
para celebrá-los todos os dias.
Prefiro os moralistas
que nada me prometem.
Prefiro a bondade astuta à confiante demais.
Prefiro a terra à paisana.
Prefiro os países conquistados aos conquistadores.
Prefiro guardar certa reserva.
Prefiro o inferno do caos ao inferno da ordem.
Prefiro os contos de Grimm às manchetes dos jornais.
Prefiro as folhas sem flores às flores sem folhas.
Prefiro os cães sem a cauda cortada.
Prefiro os olhos claros porque os tenho escuros.
Prefiro as gavetas.
Prefiro muitas coisas que não mencionei aqui
a muitas outras também não mencionadas.
Prefiro os zeros soltos
do que postos em fila para formar cifras.
Prefiro o tempo dos insetos ao das estrelas.
Prefiro bater na madeira.
Prefiro não perguntar quanto tempo ainda e quando.
Prefiro ponderar a própria possibilidade
do ser ter sua razão.

Escrevendo um currículo, Wislawa Szymborska

O que é preciso?
É preciso fazer um requerimento
e ao requerimento anexar um currículo.


O currículo tem que ser curto
mesmo que a vida seja longa.


Obrigatória a concisão e seleção dos fatos.
Trocam-se as paisagens pelos endereços
e a memória vacilante pelas datas imóveis.


De todos os amores basta o casamento,
e dos filhos só os nascidos.


Melhor quem te conhece do que o teu conhecido.
Viagens só se for para fora.
Associações a quê, mas sem por quê.
Distinções sem a razão.


Escreva como se nunca falasse consigo
e se mantivesse à distância.


Passe ao largo de cães, gatos e pássaros,
de trastes empoeirados, amigos e sonhos.


Antes o preço que o valor
e o título que o conteúdo.
Antes o número do sapato que aonde vai,
esse por quem você se passa.


Acrescente uma foto com a orelha de fora.
O que conta é o seu formato, não o que se ouve.
O que se ouve?
O matraquear das máquinas picotando o papel.