sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Não me fales de amor, Charles Kiefer


Não me fales de amor, essa ilusão
de tolos incientes que desconhecem
o poder da carne e que à luxúria

creditar precisam guirlandas de flores
e véus esbranquiçados. Não sabem,
estes tolos, que o amor acaba como

o lenho lambido pela chama, e não há
maneira de sustentá-lo aceso?
A carne não, a carne é bem mais forte

e resiste intacta por diversos anos.
Depois, adiante, a carne, sim, fenece,
mas antes, antes há de ser prece

no altar do gozo, e goza o amante
o puro instante, enquanto não chega
a hora vil do abate.

Não me fales de amor, essa tolice
de adolescente, que a confundir
desejo e ágape, se perde em círculos

de cão a mordiscar a própria cauda,
a confundir no espelho de outra
face a própria face imberbe.

O amor não desce à alma, só flutua
na terrível derrisão e movimento
incessante do rio do ser em eterno

movimento; o amor não tece futuro
nem esperança e não sabe construir
pontes entre dois seres diferentes;

o amor não basta nem a si mesmo
e não padece às conjuras dos velhos
feiticeiros; o amor verdadeiro é só

o do erasta, que ama no amante
tão somente o corpo desvalido.
Não me fales de amor, esse balido.

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