Na busca por uma dor mais profunda, mais funda, uma dor que seja real.
Os textos publicados não terão a ordem dos livros nem tampouco dos dicionários. Virão da desordem da vida, do improviso das águas, das impressões sobre qualquer coisa. Tudo que carregue o mistério de ser letra, verso, prosa. A única lógica será não ter lógica nenhuma. Pode ser que sirva, pode ser que exista, pode ser que dê. Quem sabe?
terça-feira, 31 de julho de 2012
sábado, 28 de julho de 2012
Cervantes e Picasso
Só para mim nasceu Dom Quixote e eu para ele:
ele para praticar ações e eu para escrevê-las. Somos um só.
Odes, Ricardo Reis
Vivem em nós inúmeros;
Se penso ou sinto, ignoro
Quem é que pensa ou sente.
Sou somente o lugar
Onde se sente ou pensa.
Tenho mais almas que uma.
Há mais eus do que eu mesmo...
Minha rua está cheia de pregões, Mario Quintana
Minha rua está cheia de pregões.
Parece que estou vendo com os ouvidos:
“Couves! Abacaxis! Caquis! Melões!”
Eu vou sair pro Carnaval dos ruídos,
Mas vem, Anjo da Guarda… Por que
pões
Horrorizado as mãos em teus ouvidos?
Anda: escutemos esses palavrões
Que trocam dois gavroches atrevidos!
Pra que viver assim num outro plano?
Entremos no bulício quotidiano…
O ritmo da rua nos convida.
Vem! Vamos cair na multidão!
Não é poesia socialista… Não,
Meu pobre Anjo… É… simplesmente… a
Vida!...
sexta-feira, 27 de julho de 2012
A mulher do tempo
estão dizendo
na televisão
na televisão
que a massa fria
vai se encontrar
com a massa quente
deve acontecer aí
(no meio do céu)
(no meio do céu)
uma comunhão de ares
nuvens se unindo
num balé climatizado
estão dizendo que será um final de semana quente
em quase todo país
o que não dizem
(e vou dizendo)
(e vou dizendo)
é que não importa
a massa fria
nem o ar quente
quando
nem o ar quente
quando
dentro da gente
Passeio Suburbano, Mario Quintana
Encontrei uma menina
Que me perguntou se era verdade que
iam demolir
aquele
belíssimo pé de figueira.
Não, ela não disse belíssimo...
Foi por uma questão de ritmo que
acrescentei aqui esse
adjetivo
inútil.
Feliz de quem vive ainda no mundo
dos substantivos:
o resto é literatura...
Sorri-lhe cumplicentemente
(e tristemente)
porque me lembro que em meio ao
quintal lá de casa
havia uma paineira enorme
(ultrapassava em altura o primeiro
andar de meu quarto)
Quando florescia, era uma glória!
Talvez fosse ela que impediu que
meus sonhos de menino
solitário
tenham sido todos em preto-e-branco
Uma glória... Até que um dia
foi posta abaixo
simplesmente
"porque prejudicava o
desenvolvimento das árvores
frutíferas".
Ora, as árvores frutíferas!
Bem sabes, meninazinha, que os
nossos olhos também
precisam de alimento.
Poema Transitório, Mario Quintana
vagaroso com
vagarosas
paradas
em cada estaçãozinha
pobre
para comprar
pastéis
pés-de-moleque
sonhos
---- principalmente
sonhos!
porque as moças da
cidade vinham olhar o trem passar:
elas suspirando
maravilhosas viagens
e a gente com um
desejo súbito de ali ficar morando
sempre... Nisto,
o apito da locomotiva
e o trem se afastando
e o trem arquejando
é preciso partir
é preciso chegar
é preciso partir é
preciso chegar...
Ah, como esta vida é
urgente!
... no entanto
eu gostava era mesmo
de partir...
e ---- até hoje ----
quando acaso embarco
para alguma parte
acomodo-me no meu
lugar
fecho os olhos e
sonho:
viajar, viajar
mas para parte
nenhuma...
viajar
indefinidamente...
como uma nave
espacial perdida entre as estrelas.
A Casa Grande, Mario Quintana
...mas eu queria ter nascido numa
dessas casas de meia-água
com o telhado descendo logo após as
fachadas
só de porta e janela
e que tinham, no século, o carinhoso
apelido
de cachorros sentados.
Porém nasci em um solar de leões.
(...escadarias, corredores, sótãos,
porões, tudo isso...)
Não pude ser um menino da rua...
Aliás, a casa me assustava mais do
que o mundo, lá fora.
A casa era maior do que o mundo!
E até hoje
---- mesmo depois que destruíram a
casa grande –--
até hoje eu vivo explorando os seus
esconderijos...
Cidadezinha cheia de graça..., Mario Quintana
Cidadezinha cheia
de graça…
Tão pequenina que
até causa dó!
Com seus burricos
a pastar na praça…
Sua igrejinha de
uma torre só.
—-
Nuvens que
venham, nuvens e asas,
Não param nunca
nem um segundo…
E fica a torre,
sobre as velhas casas,
Fica cismando
como é vasto o mundo!…
—-
Eu que de longe
venho perdido,
Sem pouso fixo (a triste sina!)
Ah, quem me dera
ter lá nascido!
—
Lá toda a vida
poder morar!
Cidadezinha… Tão
pequenina
Que toda cabe num
só olhar…
segunda-feira, 23 de julho de 2012
Assinar:
Postagens (Atom)